quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Metade é melhor que nada?

DoaçãoHá vários erros médicos nos prontuários deste Brasilzão afora. Meu nome é Henrique (*), faltam apenas alguns dias para eu completar 56 anos e também tenho minha história de erro médico.

Na verdade não foi um erro médico (não como consta na maioria dos prontuários) mas, na época, pensei que tivesse sido e só percebi o engodo quando era tarde demais.

Sim, não foi erro, foi falcatrua. Um golpe duro de ser absorvido.

Bem, vamos ao relato:

Nos idos finais dos anos 90 do século passado, eu me propus a doar uma parte de meu fígado a um desconhecido.

Como vocês sabem, o fígado se regenera, ou seja, o pedaço tirado cresce novamente assim como acontece com o rabo da lagartixa ou a patola do siri ou caranguejo e, por isso, podemos doá-lo em vida.

Pois é. O receptor era um milionário - não pensem que ganhei algo com isso. Negativo. Tenho o firme entendimento de que as boas ações é que fazem deste mundo um lugar melhor para vivermos e as ações deste tipo, com certeza entram nesse rol.

Bem, chega de divagações e voltemos à minha história.

Fizeram todos os exames de compatibilidade, o chefe da equipe era um dos maiores cirurgiões do Brasil e dava para notar que não se poupava - os gastos eram faraônicos.

Tudo certo, fomos os dois para uma área de isolamento em uma preparação final para o transplante.

Muitas horas de cirurgia e tudo correu bem.

Voltei para o meu quarto. Eu disse quarto? Aquilo era maior que meu apartamento.

Minha esposa estranhara o local da incisão, bem no meio do peito mas, como somos leigos, levamos tudo numa boa. Afinal o transplante fora um sucesso e os dois estavam mais que bem e isso era o que importava.

Voltei para casa e o tempo foi passando... passando.. e algo estranho estava acontecendo.

Eu gostava de tudo pela metade. Amava menos minha família, a cachorrinha de casa também sentia isso com relação a ela.

Era algo singular pois, por um lado tinha aquele amor verdadeiro e, por outro, algo mais frio, mecânico.. bem estranho.

O Palmeiras, meu time do coração, também foi afetado. Gostava dele, mas, como direi... apenas meio gostar.

É isso, achei a palavra certa. Tudo o que eu gostava, parecia que tinha se transformado em um meio gostar. Eu não entendia.

Parte eu gostava pra valer e parte era aquela coisa fria, sem graça.

Procurei uma psicóloga, a Doutora Renata Welson, e ela fez várias análises, fuçou a fundo desde a época do transplante - foi a partir dele que esses sintomas estranhos se manifestaram - e nada achou.

O tempo ia passando e eu sempre amando pela metade.

Até o dia em que fui consultar um médico para ver como andavam minhas triglicérides, colesteróis etc... em um dos exames constatou-se a grande verdade.

Não haviam tirado parte de meu fígado. Eu passei a amar pela metade porque tiraram metade de meu coração e, no lugar desta metade, puseram uma máquina!

Milionário filho da mãe!
QUERO DE VOLTAAAA!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

(*) Nome verdadeiro, texto fictício.

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