sábado, 15 de novembro de 2008

Minha primeira crônica


Antes que vocês leiam minha primeira crônica, um esclarecimento: Ela foi escrita no segundo ano do curso de jornalismo, na disciplina de Língua Portuguesa e, se querem saber, gostei de escrever crônicas. Aí vai:
Naquela noite de quarta-feira a professora de língua portuguesa do curso de jornalismo, após algumas explicações, deixou-nos com uma incumbência: teríamos de escrever uma crônica, objeto daquela aula.

No momento não me preocupei muito, afinal era somente mais um texto. Todavia, analisando as palavras ditas para a classe naquela noite, vi que havia, sim, algo diferente e não era um simples texto.

Aproveitei o domingo seguinte àquela quarta-feira, bem de manhãzinha com todos em casa ainda dormindo, até a Hanna, nossa cadelinha shi-tzu, estava em um sono só, e lá fui eu dar tratos à bola para escrever minha primeira crônica. Comecei então a lembrar das palavras da professora e determinei para mim mesmo que minha crônica teria um personagem de fora, não seria eu a protagonizá-la.

Bastou isso para que meus olhos e ouvidos começassem a ver e ouvir o que acontecia ao meu redor naquela manhã. Sentado na cadeira de praia, aproveitando o sol que batia na área de serviço do apartamento, notei um bem-te-vi na antena do prédio ao lado, soltando piados altos, talvez chamando uma namorada... sei lá.

De repente, não havia mais aquele silêncio de há pouco e instaurara-se uma barulheira danada. Eram algumas pombinhas arrulhando aqui e ali, um papagaio que latia, imitando os cachorros da vizinhança, o cachorrinho de outro vizinho que uivava, vizinhas conversando de suas janelas e um rádio que insistia em tocar músicas bregas. Parecia que todos haviam ouvido aquela conversa que eu tivera comigo mesmo e queriam protagonizar minha primeira crônica.

Barulho na cozinha... alguém acordou e deu bom dia. Compenetrado vi que eram minha mulher, as duas filhas e a Hanna. Respondi ao bom dia, expliquei meu problema e voltei aos meus devaneios sobre o que escrever. Era a primeira crônica e tinha de ser especial.

Novamente barulho na cozinha, agora de panelas. Já está perto da hora do almoço? Nossa, preciso correr... Quede a inspiração? E o protagonista? Minha filha caçula chama para o almoço. Caramba! Passei a manhã inteira aqui e não consegui escrever minha primeira crônica. Ou consegui?

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Uma crônica

Saudade do pé no chão Ao passar pela bancada de frutas de um supermercado da cidade, tomei um susto ao reparar em alguns dos preços, com o da ameixa amarela - uma caixinha com alguns desses frutos custava mais de seis reais -, ou mesmo no tamanho das jabuticabas, todas pequenas, coitadas. Pequenas e caras.

Na minha infância, junto com meus amigos, vivendo no interior e de pé no chão, comer frutas significava subir nas árvores para colhê-las. Lá estavam à nossa espera, grandes, suculentas e sem ter de pagar nada por isso. Nunca poderíamos imaginar que um dia pudéssemos encontrar aqueles mesmos tipos de frutas, agora pequenas e caríssimas, em pacotes nas bancadas de supermercados. Pagar por uma fruta cheia de produtos químicos era algo que não passava pela cabeça de ninguém.

Naqueles bons tempos em que não havia celulares, preocupações com os colesteróis da vida e outros itens que tanta dor de cabeça proporcionam hoje em dia, vivíamos com muito mais liberdade e tranqüilidade. Sequer havia crianças gordas, afinal as brincadeiras envolviam, sempre, um corre-corre sem fim - queimávamos as calorias brincando e não malhando em academias.

Saíamos de casa cedo e nossas mães não se preocupavam sobre onde estávamos. O compromisso era estar em casa na hora do almoço e da janta, que eram, invariavelmente, realizados com a família toda reunida à mesa. Comíamos todos juntos, era o peso do valor família que, infelizmente, hoje não vemos mais, ou muito pouco.

Sim, o viver com o pé no chão, literalmente e não como a figura como o termo é usado hoje, era um viver com saúde e liberdade que deixou uma saudade gostosa.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Saudade de um velho amigo


Nos áureos tempos, antes que a rodovia dominasse os modais de transporte Brasil afora, recorríamos aos velhos trens para as viagens, especialmente as de longa distância - que eram comuns, afinal, uma ida de Jacareí a São Paulo levava horas.

Este saudosismo veio à tona por ter acabado de ler um livro sobre o assunto: Nos Trilhos da História”, de José Carlos Daltozo. Um livro comemorativo aos 90 anos da Estrada de Ferro Sorocabana, que conta a história de como a ferrovia fez brotar vários municípios na região da alta sorocabana e, principalmente - foco do livro - José Teodoro, hoje Martinópolis.

Ler esse livro é sentir uma saudade gostosa de um bom tempo que não voltará nunca e a saudade aperta mais ainda quando ele toca naquilo em que eu vivi: os trens em Jacareí, no Vale do Paraíba.

O autor incluiu vários trechos de outros autores que falaram de trens, trilhos, bilhetes, passageiros, cargas e afins; falaram de uma época romântica em que até para ir a uma pescaria os homens vestiam terno e gravata e o chegar ou o partir de um trem era um espetáculo à parte. Dentre eles, na página 37, cita Benedicto Sérgio Lencioni, historiador, professor e ex-prefeito de Jacareí, cidade do interior paulista na qual passei maior parte de minha infância.

Lencioni fala sobre a estação ferroviária de Jacareí: “a estação está sem emoções. sem o alarido das vozes, sem chegadas ou partidas de trens e viajantes. Sem o riso dos que chegavam e o choro dos que partiam. Não se vendem os famosos biscoitos nem anda mais na plataforma ou percorre os vagões o jornaleiro apregoando as manchetes do dia”. Como não lembrar do trem passando, cortando a cidade, dos biscoitos da Fábrica de Biscoutos de Jacareí.

O caso dos biscoitos merece uma nota: no livro original de Lencioni, não há a palavra “famosos” que, creio, foi incorporada por Daltozo em seu livro já que eram realmente famosos e sucesso em todo o Vale, com as latinhas azuis sendo também vendidas à beira da Rodovia Dutra. Todavia, hoje, infelizmente, a fábrica de outrora está transformada em uma padaria, mas que ainda faz biscoitos.

Como esquecer da reluzente Litorina, que passava rápido fazendo sua viagem São Paulo - Rio e vice-versa, sem escalas? Era um só vagão que não parava para os acenos. Como esquecer dos trens de carga que passavam pesados, com seu barulho ritmado levando de tudo e mais um pouco? E os vagões de passageiros que traziam e levavam nossos entes queridos? Não dá para esquecer, é algo totalmente diferente que se for comparado com as estações rodoviárias, as transformam em algo frio, sem emoção.

Bom ler um livro desses que nos trazem muitas e gostosas recordações. Quem teve o privilégio de viajar de trem, mesmo com as demoras - a última vez que fui de trem de Santos a São Paulo, em 1973 ou 1974, a viagem levou cerca de quatro horas - sabe do que está se falando aqui.

Bons e românticos tempos que, parece, não voltam mais, já que o Brasil transformou-se em uma imensa rodovia.

Carlos Freire